segunda-feira, 18 de abril de 2011

Pessoa na pessoa

Quando pensei neste blog, não imaginei escrever todos os dias. Nem o farei. Tampouco pensei em escrever para milhares de leitores...Na verdade, escrevo para mim. Obviamente, ficarei feliz se souber que existem pessoas apreciando meus escritos...Mas o gostoso mesmo é poder colocar minhas viagens em algum lugar e, desta forma, tentar me esvaziar um pouco...Esvaziar a cabeça para dar espaço a novas ideias...No entanto, acredito que quando nos abrimos a algo novo o Universo acaba trazendo oportunidades ou, no mínimo, apuramos nosso olhar para aquilo que subitamente passou a ser de nosso interesse.
O fato é que hoje de manhã me veio uma cena, enquanto estava no metrô, indo para o trabalho. Eu sequer estava prestando atenção nas pessoas. Aliás, estava bastante satisfeita com o raro silêncio no trem. Lia um livro chamado Conversando com Deus, emprestado pelo Meu Amor há algum tempo. Mas a leitura foi interrompida pela voz de um senhor que havia entrado no metrô na estação anterior. Uma voz forte e grave. Percebi, sem olhar diretamente, que ele era alto e grisalho. O rapaz sentado ao meu lado (e não era assento reservado...) prontamente levantou-se e, sorrindo, cedeu lugar ao senhor. Puxa! Atitude encantadora...Diante de tal gentileza, o senhorzinho começou a comentar, de uma maneira um tanto quanto desconexa, que aquilo era uma atitude...Nossa! Sem explicação! Ele não achava as palavras...Por fim, disse que era uma atitude de “primeiro mundo”. Senti um misto de diversão e decepção...Afinal, será que é mesmo tão difícil acreditar que a bondade está mais próxima do que imaginamos? E, por outro lado, no “primeiro mundo” deve haver gente bem mal educada também...Ele, então, sentou-se no banco recentemente vago. Continuei lendo, distraindo-me vez ou outra pela fala do cidadão, que comentava a respeito dos novos trens da linha Verde, elogiando e perguntando-se se aquilo era mesmo o Brasil...Pessimista, temia, em sua conversa com os amigos imaginários, o ataque de “grafiteiros” aos trens tão novinhos e bonitos.
Após algumas estações, ele resolveu falar com alguém que estivesse presente, de carne o osso, e não com espíritos que o acompanhavam desde sabe-se lá quando e onde...E eu era a pessoa mais próxima dele... “Será que posso te interromper um pouco, a sua leitura?”. Olhei para ele, mas confesso que preferia não ter sido abordada por aquele homem. Ah, mas você prega a gentileza, o amor e respeito ao próximo. Claro! Escrevo e falo para mim também! Quem disse que já não estou contaminada pelo preconceito que paira entre todos nós, pelo medo de ser atacada verbal ou fisicamente por um estranho, pela impaciência que não nos permite criar novos laços? Sim, eu tive medo...Mas ouvi. Ele apontou para o livro em minhas mãos e disse que quem escreve em páginas amareladas como aquelas são pessoas...Pessoas...Ele apontou para a própria cabeça, numa mímica que eu entendi como  inteligência ou sabedoria. “Você leu o Jornal X...hoje?”, ele continuou.  Neste momento, tive vontade de dizer a ele que não gosto do jornal citado e já terminar aquela conversa por ali, mas apenas fiz que não com a cabeça. “Pois bem, havia uma coluna hoje falando de Fernando Pessoa, você conhece? Gosta?”. Ah! Ele conseguiu prender minha atenção! Não, não fale de Fernando Pessoa perto de mim se não quiser que eu me apaixone por você...Ele não disse mais nada. Apenas fez uma expressão de satisfação e continuou em seus devaneios, até a estação Paraíso, onde ambos descemos. Eu atônita; ele, na dele, naquela conversa com a turminha invisível...Esperou que todas as pessoas a sua frente saíssem e entrassem do vagão para depois seguir adiante; deu passagem para mulheres na escada rolante...E eu pensei que o raro e belo moram mesmo onde menos esperamos encontrá-los.
Como disse minha amiga G., a gentileza é como uma joaninha...Precisamos ter olhos atentos para enxergá-la, porque é tão pequenininha! Pode estar em muitos lugares, mas nem nos damos conta de sua existência. Mas ela é tão bela, tão colorida e brilhante que, quando a enxergamos, puxa! Nosso dia muda de tom!










"As vezes ouço passar o vento; e só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido." - Fernando Pessoa

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